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janeiro 04, 2007

A canela

Com a sua imaginação, que não me canso de gabar, o Avental descreve uma calda enriquecida que inclui um pau de canela. Canela na calda também se usa na doçaria açoriana! Mais curioso é o uso açoriano da canela com outros fins. No meu livro, dissertei sobre o uso abundante de especiarias nas cozinhas (digo bem, no plural) das ilhas açorianas. A minha tese é que, na volta do largo, com passagem obrigatória pela Terceira, os comandantes das armadas da Índia trocavam especiarias por frescos e que, assim, as especiarias entraram muito caracteristicamente na culinária açoriana, como em nenhuma outra região portuguesa (pimenta preta, cravinho, noz moscada, pimenta da Jamaica, canela, a que se junta, por acréscimo de gosto, malagueta, erva doce, açaflor, cominho).

Canela, claro que em toda a doçaria. Mas também, com exagero para meu gosto, em muitos pratos de carne de S. Jorge. Na Terceira, é tempero indispensável (no fim, já sem ferver) de uma sopa típica popular, a de cavador, termo local para o trabalhador rural. É uma sopa rica (variando com as posses) de chispe (chanco, à terceirense), enchidos, feijão, batata, repolho e abóbora. A receita está no meu livro. Experimentem comê-la com e sem o tempero final de canela e depois digam.

E em S. Miguel? Nos livros em uso, não há uma única referência a canela. É natural, porque ela vem disfarçada, na cozinha tradicional, numa coisa que já poucos sabem fazer, "todos os temperos". Vendiam-se em mistura moída, nos armazéns de secos e molhados e eram indispensáveis para tempero da fava de taberna, da carne guisada, do feijão assado, ou dos torresmos de molho de fígado.

Aqui vai um desafio. Experimentem um ligeiríssimo toque final de canela em alguns pratos típicos, como vossa variante: feijoada, sopa de abóbora, rojões, molho de lombo de porco assado.

5 Comentários:

Blogger M.C.R. escreveu...

Na preparação do molho de caril usam-se paus de canela

6/1/07 18:34  
Blogger JVC escreveu...

Não estava a pensar na cozinha indiana/goesa. Devia, porque, com a enorme comunidade radicada em Portugal, até de moçambicanos de origem europeia, já entrou na nossa cozinha.

Mas não me apanhas descalço! Caril é coisa que muito comemos cá em casa, normalmente feito, com excelência, pela minha mulher. Com um toque subtil, nada de pó de caril, tudo moído a fresco e torrado quanto baste, obviamente que incluindo canela.

6/1/07 18:43  
Blogger M.C.R. escreveu...

Longe de mim apanhar um açoreano descalço. entrtanto diz-me lá que produtos a tua mulher moe porque eu tenho-me contentado em arranjar o pó de caril junto de perquenos comerciantes indianos quando vou a Lisboa. Mas se a coisa for factível estou disposto a fazer tudo. Moer o que houver de ser moído e cozinhar o resto.

7/1/07 14:46  
Blogger JVC escreveu...

Marcelo,

Preparar a fresco é um requinte de reformado. Como dizes, há lojecas indianas com excelente pó de caril, mas não o industrial. Aqui vai, para uma só refeição, um pouco a olho (o gozo está em ir variando), segundo o que a Graça diz ser o hábito da sua velha cozinheira em Moçambique.

10-12 cardamomos secos (é raro encontrar-se, mas já se vêem nas lojas indianas), 1 c. sobremesa de cominhos, 12 grãos de pimenta preta, 4 dentes de alho, ½-1 pau de canela, 1 c. café de noz moscada ralada, um pouco de erva doce. Os outros temperos, como a polpa de tamarindo (indispensável!) ou o piripiri e o gengibre são adicionados ao cozinhado, à parte.

Moer todos os temperos e tostá-los um pouco numa frigideira siliconada, sem gordura, mexendo bem. Deixa o pó um pouco mais corado do que por vezes se vê, de um verde acastanhado, mas se te lembras de um bom caril, nunca é esta coisa amarelo esverdeada que por aqui se come, é mais escuro.

7/1/07 15:18  
Blogger Eurydice escreveu...

Eu ponho um toque de canela no borrego assado... :)

18/1/07 22:11  

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