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dezembro 03, 2006

Novamente, os Biscoitos

Volto ao vinho dos Biscoitos. Depois do Donatário, mais um verdelho de mesa, o Da Resistência. Título apropriado, vindo de uma casa vinícola que resiste a todas as limitações, principalmente as de uma pequena produção (1000 garrafas do Da Resistência), para manter a maior qualidade e genuinidade dos seus vinhos.

Sobre isto, reza o contra-rótulo, em texto de Oliveira Figueiredo:
Da Resistência, não só por dar continuidade ao primeiro vinho produzido na Ilha Terceira, há mais de 400 anos atrás, com a mesma casta, mas também porque procura resistir ao assalto de uma urbanização desenfreada e desnecessária.
Com a garrafa, veio um texto de Luís Brum:
DA RESISTÊNCIA é um vinho que já granjeou alguma simpatia, uma palavra que explica tudo, atraindo as mais delicadas e finas sensibilidades em conexão com a degustação.

Pela diferença ao encontro da originalidade dos espíritos que se não devem combater, assim como a do gosto, pois esta é uma potência invisível e misteriosa à qual é difícil resistir.

Este vinho de mesa branco é no seu trato que adquire a delicadeza, a graça, o perfume encantador da natureza. A sua nobre missão atravessa os nossos mais apurados sentidos com a égide protectora do sossego manter a harmonia entre homens e mulheres a moderação nos prazeres, num humor fácil e independente.

As sensações das nossas línguas são mais filhas do prazer, as do Noroeste da Ilha Terceira, da necessidade: línguas de lava de onde vides da verdelho ainda resistem aos tributos que a vaidade e a moda impõem.
Passemos à minha prova, com a humildade de quem é simples apreciador de bons vinhos. Não consigo deixar de fazer a comparação com o Donatário. Como escrevi, o óptimo Donatário não é vinho meu preferido, como vinho de mesa. É excelente, mas, se o tivesse, guardava-o para ocasião só de vinho, com um bom S. Jorge ou Gruyère a acompanhar (beluga em dia de S. Nunca, trufas em dia de S. Quase-nunca, foie gras em dia de S. De-vez-em-quando), em contraponto, salientando o vinho.

Bom vinho de mesa é este Da Resistência, que venceu a prova de acompanhar o meu almoço de um peixe banal e desbanalizá-lo. O vigor de sabores do seu irmão está suavizado, não domina o prato. Não sou perito, mas parece-se ser feito com boa técnica, bica aberta, inox, baixa temperatura. Tem bom bouquet, coisa nem sempre vulgar nos brancos. O sabor típico do verdelho sobressai inconfundivelmente e é uma boa aposta da Casa Brum insistir num monocasta, com os riscos que isto comporta. É um vinho equilibrado, com sabor de volume suficiente, não demasiado, com suavidade e macieza, secura quanto baste e apenas a acidez nenessária ao realce do sabor típico a verdelho. De acordo com o que eu gosto, não me sabe a frutado de uva fresca, coisa que muitas vezes domina brancos na moda internacional. O toque contrastante de algum doce está lá, mas com grande subtileza. Tal como no Donatário, mas menos acentuadamente, quase imperceptível, há um toque de maresia. Há quem não goste, "nanja" eu que, indo aos Açores, vou sempre a uma zona de calhau encher o olfacto dessa maresia tão açoriana, com cheiro a cracas e lapas.

Fica-me a curiosidade: porquê dois irmãos tão diferentes? Não me parece que seja da técnica da vinificação. Apostaria mais na diferença da localização e maturação das uvas, mas é palpite de amador.

Visitantes dos Açores, hoje não há razão para lá beberem vinhos brancos continentais. Infelizmente, não posso dizer o mesmo dos tintos, mas cada região vinícola deve concentrar-se no melhor que tem. No entanto, a concorrência é sempre positiva. Em verdelho, Luís Brum não tem concorrência, porque os brancos do Pico e da Graciosa são multicasta, o que não quer dizer que não sejam bons vinhos. Dos Açores, diz o anúncio na moda, "ê tenhe filhes". E também bom vinho. Pena é que os Açores não possam ser "um imenso Portugal"!

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